sábado, 29 de maio de 2010

Óleo sobre tela

Como um pintor que admira um painel inacabado de uma primavera distante, os dedos envelhecidos buscaram alívio em contos escritos por outras mãos. Encontraram a leveza e o bom-humor de quem ainda não passou por agruras e tiveram a ilusão de que poderiam voltar a ser úteis de destemidos.

Com um tímido comichão, ensaiaram algumas letras em um espaço vazio, prometendo exercícios frequentes e frenéticos. Mas estavam enferrujados - não dispunham de tanta destreza como outrora esbanjavam. As palavras fugiam à breve menção de serem tocadas por eles e os parágrafos amontoavam-se, tentando escapar da árdua tarefa de integrar tão frívolo e vão testemunho.

Os dedos tentaram desesperadamente ditar as impressões que os olhos haviam devorado avidamente. Prometeram descrever o indescritível, desafiaram o vocabulário e enfim morreram em pontos finais inexpressivos.